terça-feira, 15 de agosto de 2017

Férias

Queria tirar férias. Mas não essas férias que tiro desde que virei freelancer. Tentando encaixar os dias entre fechamentos, levando notebook para alguma emergência, algum texto que entrou e precisa ser revisado de última hora. Queria tirar férias sem preocupações, sem pensar se a revista X vai fechar sem mim, se a revista Y vai ter algum problema, se vai dar tempo de entregar o livro Z no prazo.

Queria tirar férias sem me preocupar com o valor da diária do hotel, se vai dar para pagar as parcelas nos próximos meses, se vai sobrar dinheiro para comprar aquela lembrancinha ou comer em um restaurante mais caro.

Queria tirar férias sem ter que me preocupar com o tempo de viagem, com o caminho, os pedágios, o trânsito. Se peguei tudo de que vou precisar, se não me esqueci de nada, se vou precisar comprar alguma coisa para levar.

Queria tirar férias sem me preocupar com os passeios programados para serem encaixados nos dias que temos disponíveis ou acordar na hora para não perder o café da manhã. Sem me preocupar com os dias que restam para aproveitar antes de voltar à rotina de trabalho, à correria do dia a dia.

Queria tirar férias e não pensar na política nacional, no futebol, na violência, nas possibilidades de guerra no mundo. Sem pensar no futuro, no presente e no passado, ou nas vidas passadas. Sem pensar se alguém gosta ou não de mim, se terei problemas caso algo aconteça, caso alguém interprete mal o que falei. Sem me preocupar se vão falar de mim, das minhas fotos, das minhas férias.

Queria tirar férias. Da minha vida. Deste mundo. Das pessoas. Queria tirar férias de mim mesma.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

De Raça Negra a Jacques Brel, Alejandro Sanz e Paco de Lucia... Música boa é a que toca sua alma!

Um dia estava revendo meus cadernos de perguntas que fiz quando era adolescente. Entre tantas perguntas, uma me fez pensar: "Qual sua música preferida?" Eu nunca colocava apenas uma. Eram sempre umas quatro ou cinco no mínimo. E a cada mês essa seleção mudava. São tantas canções de tantos estilos diferentes que são escolhidas por tantas razões... É sempre injusto escolher apenas uma. 
Naquela época eu ouvia muitos sambas e pagodes. Esse estilo estava em alta, tocava em todas as rádios, todos os programas de TV. Alguns me marcaram muito, tanto que me emociono até hoje, não pela qualidade musical ou pela letra, mas simplesmente porque a associo a algum momento da minha vida. 
A música, assim como os aromas, é um ótimo ativador de memória. E por causa disso, temos aquelas canções que nos doem na alma. Seja por uma letra bem escrita, uma harmonia perfeita, uma melodia tocante ou o conjunto disso tudo. Seja porque nos lembra um momento, uma pessoa, uma saudade de um tempo que não vai voltar. Algumas canções são tão perfeitas que nos emocionam sem nem mesmo sabermos o que a letra diz. Outras não são tão perfeitas, mas são interpretadas de forma tão brilhante que acabam ficando perfeitas.
E quando falo de emoção, é impossível não lembrar de Jacques Brel interpretando Ne Me Quitte Pas. Nunca vi uma interpretação tão emocionada, tão doída! Cheguei a chorar vendo esse vídeo. A emoção que ele passa é indescritível. Mesmo sem saber uma palavra de francês, você entende exatamente o que ele quer dizer com aquela canção. Você sente a música. Ne Me Quitte Pas é uma das canções que me fazem chorar. Mas só a versão de Jacques Brel.
Recentemente, voltou à tona outra canção que me faz chorar: Y Si Fuera Ella?, de Alejandro Sanz. Foi com ela que o espanhol me ganhou. Uma amiga chegou a me perguntar por que era minha preferida dele. Não soube explicar. É visceral. É aquela música que toca na alma, que mexe com você, inexplicável. Há várias outras muito mais bonitas, muito mais inteligentes, muito mais políticas ou românticas. Mas é essa que me toca a alma, sem dó. Que me faz ter consciência de todos os sentimentos que tenho aqui dentro. Que não me deixa pensar. Ou me faz pensar demais. Não importa se quem canta é Alejandro Sanz ou outros intérpretes. Ela continua sendo espetacular e tem o mesmo efeito em qualquer voz. Ainda que eu prefira a original.
Mas o que realmente me mata é o flamenco. Desde antes de eu saber o que era flamenco. Tudo começou com Paco de Lucía e Bryan Adams. Nem gostei tanto da letra, mas aquele violão ao fundo me fez amar a música inteira. Foi ali, aos 12 anos, que eu quis aprender a tocar violão, apenas para aprender a fazer aquilo. Anos depois, descobri o flamenco, descobri Paco de Lucia, Vicente Amigo, Camarón de la Isla. Descobri que o flamenco tocava minha alma e quis aprendê-lo. 
Catorze anos depois daquela música do Bryan Adams, ganhei um violão autografado pelo Alejandro Sanz em uma promoção e, antes mesmo de começar minhas aulas, tirei a introdução de Have You Ever Really Loved a Woman de ouvido. O objetivo era aprender flamenco, mas neste país é difícil achar quem queira ensiná-lo a alguém de nível zero. Comecei pelo erudito com um professor que queria me ensinar popular. Não deu certo. Mas a música me chamava. Tive aulas com meu noivo, entramos em uma orquestra, estudei sozinha. Cheguei a pensar em desistir, mas não. Resolvi aprender por conta, com vídeos do YouTube. Encontrei, entre tantas e tantas coisas, apenas dois realmente bons. Um deles já me fez tocar na segunda aula. Infelizmente só havia quatro aulas disponíveis. O outro... Bem, o outro foi o que me deu esperanças depois de tanto tempo. Entrei em contato com o professor, que é brasileiro, que me garantiu que o importante é ter amor pela música. E que é possível aprender em qualquer nível, em qualquer idade. O sonho começa a tomar forma agora. Sinto a música dentro de mim desde sempre. E agora é hora de começar a dar forma a ela. O caminho é longo, mas a gente começa dando o primeiro passo. Sozinha ou acompanhada, dessa vez vai! "Y los demás que aguanten!" ;)